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Águas subterrâneas: necessidade de avançar

16 de agosto de 2016

 

Recurso restrito de importância local. Contrato de risco pois não há garantia do investimento. Não há como ver, portanto não tem como confiar. Assim que os poços ficam velhos a produtividade cai. Baseados nestas percepções a gestão de recursos hídricos subterrâneos caminha a passos lentos em nosso Estado o que gera insegurança e coloca o usuário em difícil situação quanto à regularização de seus usos.


De acordo com o Vice- Diretor do Centro de Pesquisas de Águas Subterrâneas da Universidade de São Paulo – CEPAS USP, Dr. Ricardo Hirata, estas percepções apresentam-se equivocadas e não podem servir como justificativa para uma baixa eficiência na gestão destes recursos. Sobre ser um recurso restrito e somente de importância local cita o exemplo das cidades de Recife e da Região Metropolitana de São Paulo onde respectivamente 34% e 14% da população é abastecida com água subterrânea. Em nível de Brasil, 48% dos municípios são abastecidos desta forma, onde é mais indicada para aqueles com populações de até 10.000 habitantes.

 

Recentemente em nosso Estado foi divulgada a perfuração, por parte da CESAN, de 10 poços profundos para abastecer 9 municípios que encontram-se em racionamento de água. Esta ação traduz como no Estado praticamente inexiste esse tipo de prática o que acaba por sobrecarregar as águas superficiais.


Tratar a perfuração de um poço artesiano como uma loteria apresenta risco inversamente proporcional à ausência de informações. Em todo o território nacional é ínfima a quantidade de poços que se valem de estudos hidrogeológicos detalhados devido a sua complexidade e custo relativamente elevado. Considerada cada vez mais como uma possibilidade, principalmente em época de crise hídrica acentuada, os estudos para mapeamento e identificação dos locais mais propícios são fundamentais para uma gestão de qualidade.


Não se pode confiar naquilo que não se pode ver. Essa máxima também robustece a falta de estudos e de conhecimento técnico sobre nossas águas subterrâneas. Há pouca experiência acumulada no assunto e as ações são 100% voltadas as águas superficiais. Como se tratam de temas distintos, não se pode propiciar as mesmas soluções para ambos os casos. Há necessidade de investimentos urgentes para o domínio dessa área.


Produtividade cai assim que o poço fica velho. Mais uma afirmação embasada no pouco conhecimento técnico. Trata-se de uma obra de engenharia, onde diversos fatores influenciam de forma significativa na sua vida útil. Materiais utilizados, tecnologia de perfuração, manutenção, qualidade das águas e o gerenciamento da explotação do aquífero são alguns destes fatores que devem ser observados.


Quando comparado ao uso superficial, o uso das águas subterrâneas apresentam algumas vantagens, a saber algumas: menor custo (50 a 70%); aumenta a segurança hídrica; não gera resíduos; baixo custo de instalação; menor vulnerabilidade à contaminação e; maior resiliência as mudanças climáticas.


Sobre a gestão é preciso ter uma visão integrada de ambos os sistemas de captação. Não é aconselhável ter somente uma das duas como opção. As águas superficiais são mais indicadas especialmente nos períodos das chuvas onde rios e córregos apresentam um maior volume disponível. A medida que a vazão destes reduz, entra em ação o uso das águas subterrâneas para não comprometer os mesmos e assegurar o abastecimento de forma mais constante possível. Apesar de ser de fácil compreensão este método ainda é pouco utilizado e requer eficiente e permanente sistema de monitoramento de recursos hídricos.


Diante da importância do uso das águas subterrâneas surge sempre uma pergunta: por que a legislação não funciona? O primeiro ponto é a falta de fiscalização. A nossa Agencia Estadual de Recursos Hídricos – AGERH possui reduzido quadro de pessoal e a fiscalização dos usos fica a cargo de parcerias com outras instituições estaduais e municipais. Além disso, os técnicos de recursos hídricos conhecem mais sobre águas superficiais o que evidencia a necessidade premente de capacitações na área. Colabora para esta situação o exemplo da outorga para uso de água superficial que além de não cumprir com suas funções, institucionalizou o conflito pelo uso da água e burocratizou o acesso ao crédito para equipamentos de irrigação. Com isso, e também com a complexidade exacerbada imposta para o simples cadastramento de poços, onde parece que a busca pelas informações sobre nossas águas subterrâneas para uma gestão eficiente é repassada à custa dos usuários, a legislação fica a mercê da não observação pelo simples fato de ser impossível o seu cumprimento.


Por fim, muitos usuários não enxergam a clandestinidade (baseada, por enquanto, no não cadastramento aqui em nosso Estado) como uma falta grave, mesmo diante dessa situação que atravessamos. Diante de todo esse processo, podem-se indicar algumas consequências graves que comprometem ainda mais a gestão de nossos recursos hídricos, a saber: superexplotação dos aquíferos onde cada ação individual contribui para a formação de um grande problema para todos; perda de fluxos de bases que resulta na seca de rios e áreas úmidas que ainda resistem e; em áreas costeiras observa-se a entrada de água salgada em nossos rios e até mesmo em aquíferos.


Como sugestão para uma eficiente gestão dos usos das águas subterrâneas em nosso Estado, pode-se pegar como base algumas lições tais como: necessidade de uma legislação factível, que seja passível de cumprimento e ao mesmo tempo atraente para o usuário; outorga precisa ser menos burocrática, mais dinâmica e menos demorada; trabalho intenso de educação para o uso do recurso subterrâneo pois como o mesmo é individual, o monitoramento depende muito do usuário e este deve estar ciente da importância de seu papel no processo para minimização de conflitos inclusive; a nossa Agência precisa se fazer presente no campo para, principalmente, não passar a imagem de que a gestão dos nossos recursos hídricos não é apenas cartorial; estabelecer critérios para identificação de áreas mais vulneráveis para ações de gestão visto os recursos serem limitados; apoiar a perfuração de novos poços para abastecimento público especialmente nas épocas de seca e realizar a gestão do mesmo juntamente com as captações superficiais e; por fim finalizar o Plano Estadual de Recursos Hídricos para fundamentar e orientar a implementação da política estadual de recursos hídricos, seus instrumentos e também o seu monitoramento.

 

 

Murilo Pedroni

Eng. Agrônomo, Assessor da Faes e Diretor Executivo do Cedagro
   
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